A violência como princípio da sobrevivência


Há alguns milhares de anos, o Homo sapiens aprendia a manusear os instrumentos e a fazer deles a extensão de seu corpo. Ao migrar da África para a Europa, desenvolveu boa parte da cultura que acumula hoje, até por conta das temperaturas mais baixas no continente europeu. Fazendo pinça com o polegar e o indicador, criava um dos grandes diferenciais em relação às outras espécies animais.

Naqueles tempos rudes, o prazer cedia lugar à luta pela sobrevivência. Com sobrevida média de 35 anos, eram os tempos da caverna, da descoberta do fogo, onde sobrevivia sempre quem era mais forte. Nossos ancestrais nômades vagavam em busca de alimento. Inicialmente herbívoros, eram carnívoros eventuais, pois não detinham a cultura de domar o animal selvagem, aproveitando-se, assim, dos restos abatidos por seus predadores naturais. E pensar que hoje nos sentimos superiores!

A espécie humana evoluiu bastante. Adquiriu novos conhecimentos, migrou para o frio, onde se viu obrigada a adquirir meios para sobrevivência em meio inóspito. O frio, a escassez de alimentos e a ausência de proteção foram substratos essenciais para chegarmos a ser o que somos. Alimentávamo-nos para sobreviver, não existia prazer e aqueles que necessitavam de menor quantidade de comida, os obesos, em momentos de escassez alimentar extrema eram os que sobreviviam. Sim, os obesos detinham mais capacidade de sobreviver durante as intempéries, pois necessitavam de menor quantidade de calorias para a sua existência. Mas não eram gordos, porque comiam estritamente o necessário.

Aprendemos a domesticar os animais e a cultivar as plantas. Isso nos fixou ao solo, buscando proteção para aguardar o crescimento do animal e do vegetal. O excedente era desprezado, até que se constatou que outros agrupamentos humanos desprezavam, também, os alimentos excedentes. Daí surgiu a troca, que evoluiu para o comércio, que evoluiu para o marketing, que evoluiu tanto, tanto, até que o obeso engordou.

Hoje vivemos o auge do conhecimento tecnológico e isso permite conforto nunca vivenciado durante toda a evolução de nossa espécie. Nunca antes neste planeta, vivemos período de tanta oferta de alimentos! Mas continuamos brigando, agora não mais pela sobrevivência, mas por motivos vis: no trânsito, na escola, por causa de conta do restaurante, por divergir de uma nota dada pela professora. Industrializamos nosso alimento, comemos por prazer e o obeso que, em boa medida, garantiu a preservação da espécie, hoje morre mais cedo, pois associou a vida sedentária e os prazeres da gula ao seu cardápio.

Diante disso, quando vamos deixar de nos achar superiores?

Plano de saúde ou de doença?


Incrível como, não raro, confundimos alguns contraditórios. Saúde é oposto de doença e a Organização Mundial de Saúde (OMS) define muito bem isso. Diz a entidade, há muito tempo, que saúde é o completo bem-estar de um indivíduo, desde o ponto de vista físico até o psíquico e social. Não é simplesmente a ausência de doenças.

Se o seu vizinho, ao encontrá-lo no elevador, pergunta sobre sua saúde, você responde que está gripado, com pressão alta ou anda estressado e sem dormir. Nossa atenção está voltada, sempre, à doença! Por isso, os planos que se intitulam “de saúde” deveriam se autodenominar planos de doença, pois ao pagá-los mensalmente, temos a intenção de financiar o tratamento de uma doença e não pensando em garantir a nossa saúde. Os gestores destas empresas, tampouco.

Sabem por que pensamos no contrário? Primeiro, por temermos a morte e pretendermos - quanta ilusão - ter o completo controle sobre nossa vida. Segundo, porque doença dá lucro! Poucos casos são diferentes, como por exemplo, quando a preservação da saúde exige a utilização de medicamentos e, concomitantemente, geração de gastos.

Sabemos que o Homo Sapiens existe há 300 mil anos e possuem grandes diferenças dos demais seres vivos, como a consciência de sua existência. Tais características permitiram que adquiríssemos a habilidade de criarmos instrumentos e, assim, potencializar nossas possibilidades de melhor qualidade de vida. Caminhávamos em busca de alimentos e criávamos instrumentos de caça, pesca e de defesa. Nosso organismo, ao longo dos milhares de anos, foi se preparando e especializando para realizar as tarefas mais complexas, até chegarmos à era digital. Evoluímos tanto, que surgiram as doenças nervosas, a obesidade e outras moléstias crônico-degenerativas, como a hipertensão arterial, o diabetes, as artrites, e os cânceres, etc.

As pessoas estão tão envolvidas em suas rotinas, que se esquecem de cuidar do mais precioso bem que possuem: a saúde. Outro dia, ouvi de uma pessoa que a impossibilidade de fazer exercícios físicos se devia à falta de dinheiro para matricular-se em uma academia. Ah, se nossos ancestrais Neandertais ouvissem isso!

Vivemos em uma região propicia para a realização de atividades físicas ao ar livre. Temos muitos quilômetros de orla, com espaços e paisagens perfeitos para a prática desportiva. Quem não gosta de pedestrianismo, pode jogar futebol com os amigos, frescobol à beira-mar ou caminhar nos calçadões. Em Santos, mais da metade da população possui um plano de saúde particular. A outra parcela da população se utiliza do sistema público de saúde, o SUS. E fica a pergunta: o que esses planos fazem para manter seus clientes com boas condições de saúde?

Que tal, um plano de saúde que contribua com nossa saúde? Um serviço que nos ajude do ponto de vista social e psíquico, a sermos mais alegres, mais amigáveis com nossos vizinhos. Que nos faça caminhar na praia, ir ao cinema, namorarmos mais e sermos mais felizes. Funcionaria assim: pagamos uma quantia por mês, e teríamos direito a dez passeios de bicicleta, dois ingressos para o cinema, uma festa no bairro. Para esse plano de saúde, como médico, faria propaganda de graça na televisão.

O SUS que pouca gente conhece


O Sistema Único de Saúde (SUS) nasceu na década de 80, fruto da reivindicação da sociedade civil, por meio de movimentos pela reforma sanitária, e foi institucionalizado pela Constituição de 1988. O SUS tem como premissa básica integrar e coordenar ações de saúde nas três esferas do governo: Federal, Estadual e Municipal. O objetivo é “articular e coordenar ações promocionais e de prevenção, como as de cura e reabilitação”.

São três os princípios doutrinários que conferem legitimidade ao SUS: a universalidade, a integralidade e a equidade. A universalidade está ligada à garantia do direito à saúde por todos os cidadãos brasileiros. Tal conceito parte da ideia de que existem várias dimensões integradas envolvendo a saúde dos indivíduos e das coletividades. Como princípio complementar ao da universalidade, significa tratar as diferenças em busca da igualdade. Este princípio veio ao encontro da questão do acesso aos serviços, muitas vezes prejudicado por conta da desigualdade social. Fala-se em prioridade no às ações e serviços de saúde por grupos sociais considerados mais vulneráveis, do ponto de vista socioeconômico.

A concepção de um sistema universal de saúde e a institucionalização por meio da Constituição foram um dos maiores avanços na luta pela construção do país que tanto queremos: mais justo e menos desigual. Se ainda existem problemas no atendimento público da saúde, e não são poucos, é inegável o fato de que o SUS contribuiu demasiadamente para o fortalecimento da cidadania nacional, afinal o direito ao acesso aos serviços de saúde é um importantíssimo direito social.

Pouca gente sabe, mas temos no país o maior sistema de saúde pública do mundo! Devemos nos orgulhar desta posição. O brasileiro é um dos poucos povos no planeta que pode dizer que saúde é considerada um direito constitucional em seu país.

Possuímos, atualmente, um dos maiores programas públicos de transplantes de órgãos e tecidos do mundo. São 548 estabelecimentos de saúde e 1.376 equipes médicas autorizadas a realizar transplantes de qualquer tipo. No primeiro semestre de 2012, foram realizados 3.550 transplantes de órgãos e 3.265 de tecidos, 26,5% a mais do que o mesmo período no ano anterior.

Outro dado interessante é que foram realizadas 65,4 mil cirurgias cardíacas, no ano de 2009. O Brasil é o segundo país em número de cirurgias cardíacas no mundo, com a grande maioria realizada pelo SUS.

Igualmente, o Ministério da Saúde oferece tratamento gratuito e universal aos portadores do vírus causador de hepatite C. São distribuídos medicamentos de alto custo, além de completo atendimento ambulatorial e hospitalar. O mesmo acontece com portadores do vírus HIV. Desenvolvemos, em nosso País, o maior programa mundial de combate, prevenção e tratamento da AIDS, transformando-nos em modelo para inúmeras outras nações. Este projeto, por sinal, se iniciou aqui em Santos com o inesquecível médico David Capistrano Filho.

O Brasil é um país com dimensões continentais, portanto deve destinar esforços com esta mesma proporção para cuidar da saúde de seus cidadãos. Consolidar essas ações, garantir atendimento básico e de urgência com qualidade deve, neste momento, ser a prioridade de todos os gestores da saúde pública brasileira.

Por isso, clamamos aos novos secretários municipais de saúde: contamos com vocês!

O Carnaval está chegando. Dicas para cair na folia com tranquilidade

A maior festa popular do Brasil começa no final de semana. A chegada do tão aguardado Carnaval é motivo de alegria entre os brasileiros, apaixonados pelo clima que se instaura de Norte a Sul do nosso país.

Como em todos os anos, os serviços públicos de saúde lançam campanhas para conscientizar sobre os perigos de determinados comportamentos de risco e orientar os foliões a tomarem alguns cuidados para cair na folia com total segurança.

O principal “vilão” da festa continua a ser o vírus HIV, transmissor da AIDS. Diversas campanhas de prevenção foram lançadas com o objetivo de esclarecer a importância da utilização da camisinha nas relações sexuais. A Secretaria de Saúde do Distrito Federal, por exemplo, recorreu ao slogan “Ressaca tem cura, Aids não. Sexo só com camisinha”. Cabe lembrar que relações sexuais com preservativo são grandes armas na prevenção contra outras doenças sexualmente transmissíveis, como sífilis e hepatite.

Pouca gente se atenta, mas a precaução com a saúde nesta época do ano pede, também, atenção com a alimentação. Combinações entre alimentos gordurosos e álcool podem sobrecarregar o fígado. Por isso, consumir frutas, sempre hidratar-se e preferir alimentos leves é uma ótima receita para curtir o Carnaval e cuidar da saúde ao mesmo tempo.

Uma dica é conferir a campanha “Meu Prato Saudável”, realizada pelo Hospital das Clínicas da FMUSP em conjunto com o Instituto do Coração (InCor). O site www.meupratosaudavel.com.br é ótima fonte de informações sobre como alcançar o equilíbrio alimentar durante o Carnaval.

Com todos estes cuidados tomados, é esquentar os tamborins, caprichar na fantasia e sair para a festa!

Bom Carnaval a todos!

Liberdade, abra as asas sobre nós!


Assim cantou a escola de samba Imperatriz Leopoldinense no carnaval carioca de 1989: “Liberdade, liberdade, abra as asas sobre nós. E a que a voz da igualdade seja sempre a nossa voz”. Os autores desfilavam, em poesia, o sentimento popular contra a fidalguia do Império, contra a guerra, a escravidão e a esperança pela conquista da igualdade de oportunidades.

Tal qual a poesia popular, Aristóteles, o filósofo grego, afirmava que “é livre aquele que tem em si mesmo o princípio para agir ou não agir, isto é, aquele que é causa interna de sua ação ou da decisão de não agir”. O que nos faz pensar se realmente estiveram livres os negros após a abolição da escravatura.

O economista indiano Amartya Sen, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1998, explica que só existe liberdade plena com desenvolvimento e eliminação das privações que limitam escolhas e oportunidades. Entre essas privações de liberdade estão: pobreza, carência de oportunidades econômicas, negligência de serviços públicos e intolerância.

Ainda segundo Aristóteles, a riqueza não é um bem em si, mas um meio para conseguirmos mais liberdade e sua utilidade está nas coisas que ela nos permite fazer, conceito chamado pelo economista Sen de liberdades substantivas.

Sentir-se livre, portanto, dentro de um conceito filosófico, é ter a sensação da liberdade de poder agir. Mas para tanto, é preciso ter meios para provocar a ação. Sem o que, esta se tornaria inócua. De que vale o direito de ir e vir, garantido pela Constituição Federal, se não temos para onde ir? De que vale ter o direito à vida, sem acesso a sistemas de saúde eficazes, privado de educação de qualidade e sem moradia digna?

Santos diz em sua bandeira, que é a terra da caridade e da liberdade. Mas na prática, a teoria é outra, como dizia o célebre Joelmir Beting. Estudantes do curso de Economia da Universidade Católica de Santos, Andressa Riechelmenn e Daniel Carvalho publicaram o trabalho “Sobre a liberdade em Santos”, baseado no conceito de liberdade substantiva. A conclusão dos estudantes é que somente 29% dos santistas, pertencentes às classes mais ricas, vivem em liberdade plena. A pesquisa teve como base os dados aferidos pelo Censo de 2010 do IBGE.

Liberdade, igualdade e fraternidade, princípios da Revolução Francesa em 1789, marca a luta pelos direitos dos homens, luta pela vida digna. Um princípio ainda distante de 71% de nossa população. Uma luta ainda presente como nossa bandeira, que precisa permanentemente ser desfraldada.