Vida tem preço? Homenagem à Lucas!


A Baixada Santista está estupefata com a morte do recém-nascido Lucas, de um mês e meio de idade no dia 20 de maio. Para quem não conhece a história, o pequeno Lucas sofria de cardiopatia congênita e faleceu na UTI da Santa Casa de Santos. Ele precisava ser removido para o Instituto do Coração para se submeter a uma cirurgia. Uma determinação judicial obrigava o Governo do Estado de São Paulo a fazer o deslocamento da criança e a operação, só que a administração estadual se recusou a pagar um helicóptero para a transferência do paciente. O agravante da situação é que o Estado não cumpriu uma liminar, assinada pelo juiz da Vara da Infância e da Juventude de Santos, Evandro Renato Pereira, que determinava ao Estado que procedesse a transferência, até com a ajuda de um helicóptero, se preciso fosse.
Ora, o quanto vale cumprir a determinação judicial e salvar uma vida? Sou solidário com a revolta e desabafo do colega Cesar Augusto Conforti (foto), do Departamento de Cirurgia Cardíaca da Santa Casa de Santos, que fez severas críticas a Administração Municipal e Estadual. Segundo ele, a Saúde estadual é tratada como um “engana que eu gosto”.

Conforti afirma que o Estado e a Prefeitura vendem a falsa imagem de que prestam atendimento cirúrgico para crianças de baixo peso. De acordo com ele, os médicos são impedidos pelo Poder Público de realizar cirurgias nesses pacientes porque é caro e ninguém quer pagar a conta. O pior, segundo ele, é que a Santa Casa possui todas as condições de realizar a operação que Lucas precisava. Falta apenas uma UTI apropriada para isso. E mais: Conforti sugere a prisão do prefeito, do secretário de Saúde de Santos e do Estado como responsáveis pelo falecimento do recém-nascido.

A Constituição Brasileira garante a Saúde como direito de todo cidadão. É dever dos que estão em mandatos públicos Executivos fazer valer os direitos de todos nós. Afinal, os deveres, como IPTU, ISS e outros impostos eles nunca esquecem de nos cobrar, não é mesmo?

A morte do anjo Lucas deve servir de impulso para que dotarmos não apenas Santos, mas toda a Região, dessa UTI capacitada para operar pacientes recém-nascidos.  E que merecidamente a unidade leve o nome do menino, uma forma de perpetuarmos a inoperância de todos os envolvidos que não cumpriram a missão essencial e primária de todo servidor público: proporcionar VIDA a todos os cidadãos.

A tragédia da vida privada (e pública)

Conceitos mudam muito pouco em um curto espaço de tempo. Como o ponteiro do relógio, que não param, mas não os sentimos, a moral dos nossos tempos também se transforma sem  percebemos.

O objetivo deste artigo não é julgar a moral sob aspectos religiosos. O intuito é analisá-la como quer o seu real significado. Moral são os costumes que norteiam uma sociedade. O conjunto de regras adquiridas através da cultura, da educação, da tradição e do cotidiano. Orientam o comportamento humano dentro de uma sociedade, como princípios de honestidade, respeito e bondade, virtudes que acreditamos ser da natureza da espécie humana, mas na verdade são valores adquiridos durante nossa trajetória de milhares de anos de evolução.
 

A moral é dependente da tradição, de acordo com sociedade e a época. Enfim, não são valores definidos e petrificados.
 

Durante a Revolução Francesa vários cidadãos foram vítimas da guilhotina por conspirarem contra a criação da república. No Brasil, a ditadura militar torturou e matou milhares de pessoas, com o pretexto de defender o País da influência comunista. Em ambos os casos, a moral dos grupos opressores justificava, sem sentido, tais atrocidades.
 

A sociedade de hoje vive momentos de incertezas. Conceitos de moral são debatidos, frequentemente, entre antropólogos, sociólogos, filósofos e especialistas em geral.
 

Nos dias de hoje, acompanhamos a involução da humanidade. Motoristas dirigem bêbados sem remorso, a ponto de protagonizarem barbáries como o fatídico atropelamento do jovem a caminho do trabalho, arrancando-lhe o braço, que foi jogado ao esgoto. Sequestra-se e asfixia-se uma jovem, cujo corpo é esquartejado e jogado aos cachorros famintos.
 

Dois exemplos emblemáticos da violência que atinge todas as camadas da sociedade, das baixas às mais altas. E sabe qual a justificativa? Nenhuma. Nenhum interesse econômico ou ideológico esta em jogo, apenas parcos sentimentos de vaidade, rebeldia, imprudência, ciúmes, vingança.
 

Denúncias de corrupção e suborno nas mais altas esferas governamentais são, cada vez mais, comuns. Servidores públicos que recebem fartas quantias em dinheiro das mãos de fornecedores. Diretores de órgãos federais reguladores que transitam na iniciativa privada, de um lado a outro, como se isso fosse algo indiscutível e banal, afinal só na mente destas pessoas os interesses do Estado são os mesmos da iniciativa privada, certo?
 

Por que haveria de ser diferente? Os tempos são outros. Arrancam-se braços, esquartejam-se mulheres e homens, rouba-se o Estado, transita-se entre o público e o privado com tanta naturalidade que, tal qual o ponteiro do relógio, como disse anteriormente, a moral mudou e só agora estou percebendo isso.

Que susto!!

O susto é uma reação biológica a algo que acontece inesperadamente e que o corpo entende como uma situação ameaçadora.

O nosso organismo reage, imediatamente. São desencadeadas inúmeras reações mediadas por neurohormônios que nos prepararam para uma reação de sobrevivência. A adrenalina é secretada em grande quantidade. Isso provoca taquicardia, palidez cutânea e, entre outros, o aumento da liberação de glicose. Como esta é substrato energético para a atividade muscular, exige maior quantidade de insulina para “jogá-la” para dentro do músculo. Assim, entra em ação o pâncreas.
 

Quando ingerimos um alimento integral com fibras, a absorção dos nutrientes se dá de modo mais lento e forçando o estômago a trabalhar mais. Ao contrário, se ingerirmos um alimento “refinado ou beneficiado” sem fibras, a absorção dos nutrientes, especialmente, da glicose, se dá quase que automaticamente. Essa “explosão” de açúcar na corrente sanguínea faz com o pâncreas libere com mais intensidade altas quantidades de insulina para que esta glicose seja absorvida. Tal qual no susto. Uma resposta exagerada!!
 

Se quando tomamos um susto à natureza entende que estamos sendo ameaçados e nos protege, quando ingerimos açúcares refinados a reação é a mesma. Muita insulina para digerir a glicose. Mais insulina do que o necessário faz com que em pouco tempo toda a glicose tenha sido absorvida advindo à hipoglicemia. Baixa quantidade de açúcar no sangue estimula o “centro da fome” e gera mais apetite. Entenderam porque quem belisca, belisca muito e esta sempre com fome? E porque quem ingere alimentos integrais tendo digestibilidade mais lenta e progressiva preserva as sua saúde? Atitude que ajuda a emagrecer?

Novos médicos, velhas práticas!

O Governo Federal anunciou, esta semana, a “importação” de médicos desempregados de Portugal e da Espanha, e, tantos outros provenientes de Cuba. Alegam que a medicina no Brasil esta concentrada nas grandes cidades e a necessidade de sua interiorização de modo a permitir maior acesso da população à assistência médica é urgente.

Isso não é novidade para ninguém. Somos dois países, dois Brasils. O último Censo do IBGE de 2010 deixa claro essa evidência. Se entre os brancos a taxa de analfabetismo é de 5,9%, entre negros e pardos, é de 17,4%. Nosso país, nas últimas décadas, viveu um dos mais avassaladores processos de urbanização já ocorrido no mundo: 84,4% dos brasileiros vivem nas cidades e apenas 15,6% deles estão fixados nas áreas rurais.

São dois Brasils, um do Litoral e outro do Interior, um das cidades e outro do campo, um dos brancos e outro dos negros e pardos, um rico e outro pobre.

Como romper com essas diferenças? Distribuindo melhor a renda, oferecendo melhores condições de habitação, educação com mais qualidade, oferecendo serviços resolutivos de saúde pública e ampliando ações de prevenção, recuperação e reabilitação mais próximas das casas das pessoas.

Não faz muito tempo, a Presidenta Dilma afirmou que uma das dificuldades para melhorar a saúde publica no Brasil é o insuficiente número de médicos e sua má distribuição sobre o território nacional. Para ela, a solução é a interiorização de cursos de medicina para manter um elevado padrão de qualidade. Mas temos um número de médicos insuficiente para atender toda a nossa população, como afirma nossa presidenta? Não. A quantidade de médicos formados e em atividade no Brasil é mais que suficiente. 

Segundo a Organização Mundial de Saúde -OMS, é suficiente uma relação de um médico para cada 1000 habitantes, e, no Brasil, existe 01 médico para cada 543 habitantes. Quanto a má distribuição desses médicos, Dilma tem razão, a grande maioria esta concentrada nas grandes cidades, o que faz com que no Brasil rico exista excesso desses profissionais enquanto que no Brasil pobre exista sua carência. Santos, por exemplo, possui um médico para cada 158 habitantes.

O grande desafio não é o de formar, e mal, mais médicos ou importar profissionais de formação duvidosa. O desafio é interiorizar o médico já existente por aqui. Por que a Cidade de Santos tem esse número excessivo de profissionais? É simples. Eles são atraídos pela pujança econômica do lugar, que, por sua vez, cria condições favoráveis para que sejam instalados serviços de qualidade que se prestam à formação de novos profissionais.

São desafios nada fáceis, mas não vejo outro caminho a percorrer se estivermos pensando nas próximas gerações e não nas próximas eleições. Estimular a migração de médicos que falam outra língua, cuja formação profissional não tem nada a ver com a nossa realidade e oferecer salários irrisórios não pode ser a melhor opção. Se não é bom para nós, por que seria para o estrangeiro? 

O quinto dos infernos e o santinho do pau oco, de novo!

A chegada de Pedro Alvares Cabral ao litoral brasileiro em abril de 1500, representou para Portugal um grande feito nas disputas com a Espanha entorno dos novos territórios desbravados e sua corrida pelas especiarias indianas. Nesse período inicial, os portugueses se limitavam ao extrativismo do pau-brasil, à época uma valiosa madeira, cuja tinta vermelha era comercializada por toda a Europa.
 


Com a necessidade da ocupação do novo território, Martim Afonso busca o interior e inicia um novo ciclo, da cana-de-açúcar. Tal estratégia garante a posse definitiva da nova colônia e grande desenvolvimento econômico à custa da mão de obra escrava, o que aconteceu até meados do século XVIII. Importante: onde se lê desenvolvimento econômico, lê-se extração de riquezas.

A este período, seguiu-se o “Ciclo do Ouro” com a descoberta de grandes jazidas do metal precioso em Minas Gerais. O poder se desloca do nordeste para o sudeste, a cidade do Rio de Janeiro é nomeada a nova capital da colônia e, no campo artístico, se destaca Aleijadinho como a maior expressão do barroco mineiro.

Nesta época, a Coroa portuguesa, defendendo seus interesses econômicos impõe a cobrança de um imposto chamado “quinto”, ou seja, 20% do ouro extraído teria que ficar retido, compulsoriamente, pela coroa. Tal como nos dias de hoje, a população esbravejava contra essas iniciativas e o mandava para o inferno, e, outros mais ousados, o escondiam dentro de imagens sacras ocas.

Os anos se passaram, os portugueses extraíram madeira, cana de açúcar, café, algodão, ouro e inúmeras outras riquezas deste país continente, e não ficaram ricos. Limitaram-se a pagar as bugigangas adquiridas na Inglaterra e por sua proteção militar. Portanto, digamos uma relação nem um pouco alvissareira.

A história é importante para que não cometamos os mesmos erros do passado, e para que possamos construir um futuro mais seguro, é o que aprendemos.
Vivemos a expectativa de um novo ciclo, a partir de uma riqueza natural: o Pré Sal. Seus recursos poderiam servir de impulso à construção de uma nova nação. Mas não foi assim que o Congresso Nacional decidiu.

Ao invés de canalizar esses vultosos recursos para a educação, optaram pela decisão, tal quais os árabes, de pulverizá-lo. Ao contrário do que fez a Noruega, que o concentrou na valorização do conhecimento e das pessoas. Ao tomar esta decisão, optam pelas obras faraônicas em detrimento do saber e agem como colonizadores, que sugam nossas riquezas e nos deixam mais pobres.

A saída para isso, esbravejar os senadores e esconder um pouco de saber para que eles não nos expropriem.

Por que não constroem casas para os pobres?

Pobre não tem dinheiro para comprar apartamento de luxo na praia e os construtores querem seus lucros, essa é a justificativa que apresentam.     Mas como isso acontece se a Constituição brasileira, que é a lei mais importante do País, em seu artigo 6º, entre outros direito sociais, assegura o direito à moradia digna a todos?

Moradia é um dos direitos mais básicos na vida de uma pessoa. Sem uma casa digna para viver o indivíduo vai ter uma saúde precária, dificuldade para arrumar emprego, educação, cultura; tudo fica mais difícil.

Foto - Matheus Tagé/DL
Historicamente, os governos (seja municipal, estadual ou federal) pouco dão importância para a moradia. Aqui em Santos, vemos dezenas de prédios serem erguidos todos os dias. Não precisa ir longe, é só dar uma passada na Lagoa da Nova Cintra e vamos ver uma verdadeira selva de pedra e, ao seu lado, mais um empreendimento a ser erguido. Quem esta ocupando esses apartamentos novos? Os moradores do Morro? Não. Mas nada contra, afinal, agora, são nossos vizinhos.
 

Se, por um lado, a Prefeitura, nada faz por aqueles que mais necessitam, por outro, facilitam a vida dos construtores, que só pensam nos lucros. Não fosse assim, teria exigido o “Estudo de Impacto de Vizinhança” dessas novas construções.

Isso significa dizer que técnicos da prefeitura tinham que realizar um estudo anterior ao início das construções a fim de avaliar o seu impacto na vida das pessoas que residem por perto. Ora, quantas pessoas vieram morar no morro com os novos prédios? Essas pessoas terão que transitar pelas ruas, vão ter luz em suas casas, falar ao telefone, especialmente, os celulares, produzirão esgoto e consumirão água, muita água. As ruas ficarão com o transito carregado, o aporte de água terá que ser maior. Feito este estudo, pode-se chegar a conclusão que a área não é indicada para a construção e a vinda de mais pessoas para o lugar.
 

A “Outorga Onerosa do Direito de Construir” é outra dessas peças prevista na legislação federal, mas que aqui em Santos fingiram que ela não existia. A lei prevê que se o novo empreendimento causar algum dano à Cidade ou algum prejuízo aos seus vizinhos, o construtor teria que pagar um valor à municipalidade, e este revertido em moradia.
 

Mas, infelizmente, nada disso aconteceu. Ao contrário, a população de favelados, dos que moram em situação de risco, quase dobrou nos últimos anos. Somos mais de 10 mil morando em condições de alta vulnerabilidade. Já moradia populares construiram pouco mais de mil, e, mesmo assim, com muita festa e político cortando fita de inauguração.
 

Este filme vem se repetindo por muito tempo. O “Movimento Pró Moradia dos Morros” tem papel importantíssimo nesta luta. Por isso, devemos fortalecê-lo, ir às reuniões e falar sobre com os amigos e vizinhos. Casa própria de presente, só nos programas de televisão, no mais só a luta permanente garantirá algum avanço em benefício daqueles que mais necessitam.

Apertem os cintos, os médicos sumiram !

É recorrente lermos nos jornais matérias que reportam a falta de médicos nos pronto-socorros e hospitais da Baixada Santista. Não sei se esse fenômeno é local ou atinge todo o Estado e o País. O fato que essa é uma realidade com a qual vivemos: faltam médicos, sobram pacientes.



Um dia desses, passei na porta de um desses pronto-socorros e resolvi entrar. Não que eu estivesse com algum problema de saúde, ou mesmo, dor de dente. Nada disso. É que me deu uma pontinha de saudade daquele lugar. Éramos felizes e não sabíamos. Pois havia trabalhado naquela unidade de Saúde há uns bons anos.



À entrada, na recepção, tive a impressão que comemorávamos o dia de São Cosme e Damião. Tinha muita gente, mas ao invés de balas e doces, esperavam atendimento médico! Olhei, com mais cuidado, e não vi ninguém com face de dor aguda, se contorcendo ou sangrando. Me questionei se ali ainda funcionava um pronto socorro, ou seja, um lugar que se presta ao atendimento de casos urgentes e emergentes. Só para lembrar, segundo o dicionário, urgência é o mesmo que “pressa, brevidade, necessidade imediata” e emergência, algo que seja “inadiável, iminente, uma situação crítica, de perigo, imprevista”. Não foi isso o que vi.  Mas, conversando com os funcionários, estes apressados pelo excesso de trabalho, uma vez questionados sobre a enorme fila, responderam uníssonos: “a população cresceu muito”!



Mas quantos ali tinham necessidades urgentes para serem atendidas? Quanto a população cresceu? Resposta? Pouquíssimos tinham necessidades urgentes e, portanto, não deviam estar ali. E, pasmem, senhores, a população de Santos não cresce desde a década de 80!



Por que, então, a Saúde na cidade representa o calcanhar de Aquiles de qualquer Prefeito?



Porque falta planejamento. Falta entender que Saúde é resultado de boas condições de moradia, educação, segurança e transporte digno. A falta de qualidade de vida acaba por atingirem em cheio a Saúde de qualquer localidade.



Falta entender que assistência médica se faz a partir do entendimento de nossas necessidades, o que exige um amplo levantamento delas, o que tecnicamente, chamamos de diagnóstico de saúde e epidemiológico. De onde vêm esses pacientes? Para onde são encaminhados após o atendimento inicial? Quais os principais motivos que os fazem procurar as unidades de saúde, sejam elas ambulatoriais ou de urgência? Quantos profissionais e suas especialidades são necessários para atender esta demanda?



Falta entender o papel social dos profissionais de Saúde, quer sejam médicos, enfermeiros, dentistas, fisioterapeutas, ou administrativos. Talvez, ainda, falte vontade política. Um amplo diagnóstico deve ser feito e muito trabalho a ser realizado. Os princípios técnicos estão aí, não é mais segredo pra ninguém. A informática esta acessível ao serviço público e sua implantação deve ser prioritária. Sem informação não existe planejamento! Esta máxima é conhecida por qualquer estudante de faculdade, e será com ela que esta administração municipal deverá trabalhar.

Doutor robô?

O paciente vai ao consultório e, antes mesmo de expressar o que sente, pede que seu médico solicite exames. “Olá doutor, solicite todos os exames que puder”. Essa é a rotina. A preocupação maior das pessoas, hoje em dia, não é mais relatar ao médico suas dores, angústias e incertezas; preferem consultar as máquinas.

Não temos como negar as maravilhas que a tecnologia proporciona. Já estão incorporadas em nosso dia a dia. Ajudam no trabalho, nas comunicações, na cozinha, até nos painéis dos carros. Na medicina e nos exames complementares, o cenário não é diferente. Hoje, o neurologista necessita da precisão da ressonância magnética. O cardiologista, das imagens do eco-cardiograma. O angiologista, do duplex scan venoso. Enfim, a tecnologia trouxe à medicina grandes possibilidades diagnósticas e de tratamento.

Cometemos, assim, um erro crasso. Encontramos, nestes exames, a resposta para todos os nossos males e fazemos dele a base do atendimento em saúde. Ontem, hoje e sempre, a máquina, em tempo algum, substituirá o homem.

Planos de Saúde pagam mais por exames do que por uma consulta médica.

Por mais que a sociedade valorize a realização de tomografias computadorizadas de crânio com contraste, sabemos que 85% dos problemas de Saúde são resolvidos por equipes de profissionais com boa formação, incluindo o Agente de Saúde Comunitário.

O agente está em contato direto e permanente com as pessoas e os núcleos familiares sob sua responsabilidade. Conhece seu público, casa a casa, morador a morador, e são capazes de se antecipar às necessidades. Entendem as angústias, os medos e demais determinantes causadores de doença. Vivemos o momento em que não são mais bactérias e parasitas os maiores causadores de doenças. Hoje, morremos de ansiedade, angústia, má alimentação (excesso de comida industrializada), sedentarismo, violência. Quanta ilusão achar que máquinas poderiam traçar este diagnóstico!

Aos gestores de Saúde pública, a prioridade é organizar o “postinho de saúde de bairro”. Com ênfase na Atenção Primária a Saúde (APS), podemos garantir um sistema universal para acesso aos cuidados com a Saúde, como direito de todos e responsabilidade do Estado, conforme escrito na Constituição Brasileira, desde 1988.

Desta forma, o pronto-socorro funcionará somente para atendimentos de urgência, especialistas serão encarregados dos casos especiais e hospitais receberão os doentes que exigem internação. E, quando necessário, teremos acesso a exames de alta complexidade.

Organizar o sistema, dar prioridade para o que for prioritário, hierarquizar o atendimento e comprometer a equipe multiprofissional é um bom começo. Fora isso, é imaginar que um dia poderemos chorar nos ombros de robôs.

Viva a ansiedade e produza

É comum dizer que ansiedade é ruim, que faz mal às pessoas, que acabam por se consumir por um estado permanente de eminência de fatos ruins e cuja emergência os obrigam a se manterem em estado de alerta. Fulano é muito ansioso, não dorme, gagueja, tem tremor nas mãos e nunca termina o que esta fazendo, ao invés de completar sua tarefa já esta pensando no próximo compromisso. São pessoas de relacionamento amoroso instável, às vezes, muito irritadasa ponto de comprometer a sua vida social. E, muitas vezes, portadoras de vício, como o tabagismo, a impulsão alimentar, o hábito de roer as unhas, entre outros.

Se isso é verdade, também não está errado dizer que a ansiedade faz bem.

Em psiquiatria, na maioria das vezes, tão importante quanto à existência de sinais e sintomas, é a intensidade e o tempo desses sinais e sintomas. Quem nunca, em alguma fase da vida, não brincou de pisar, somente, fora (ou dentro) das listras da calçada, ou no calçamento mais claro ou mais escuro? Quem nunca teve a mania de deixar a escova de dente numa só posição? Nem por causa disso é obsessivo ou compulsivo.

Ansiedade é uma resposta que nosso organismo oferece a uma situação de agressão. Assim, stress é igual a uma agressão e a ansiedade age como resposta. Criamos um mecanismo biológico de defesa que poderia significar a sobrevivência, ou não, de nossa espécie. Imaginem, há milhares e milhares de anos, quando nômades, vagávamos em busca de alimentos! Com certeza, nossa rotina alternava entre apanhar vegetais (por isso fazemos pinça entre o indicador e o polegar), nos proteger do frio, do sol, e outras intempéries e, enfrentar ou fugir de animais que pudessem ameaçar nossa integridade. Enfrentar um leão ou uma cobra venenosa exigia grande esforço, pois, desconhecíamos as ferramentas e só podíamos contar com nosso próprio corpo em nossa defesa.

Acontece, então, uma Reação de Alarme. O coração aumenta seus batimentos (taquicardia), a pressão sanguínea aumenta, os vasos sanguíneos da pele e dos órgãos se contraem (vasoconstricção) e os do másculo se abrem (vasodilatação), o fígado libera glicose (glicogenólise), ocorre dilatação dos brônquios (broncodilatação) e aumento da frequência respiratória (hiperpneia), as pupilas se dilatam (midríase); enfim, uma cascata de hormônios e neurotransmissores é desencadeada e entram em ação em milésimos de segundos. Órgãos como o hipotálamo, a hipófise e as suprarenais comandam essas reações.

Mas se você não morreu ou não conseguiu fugir e teve que se manter em situação de espreita, em permanente atenção, acontece a Fase de Adaptação ou Resistência, quando a tensão se mantem e o risco iminente ainda esta presente. Mas, esta não é uma fase ilimitada. Ao contrário, é passiva de esgotamento. Quando isso acontece, se instala a Fase de Exaustão, começam a falhar os mecanismos de adaptação e déficit das reservas de energia. O organismo já não é capaz de equilibrar-se por si só e sobrevém a falência adaptativa.

A esse conjunto de reações neuroendócrinas, chamamos de Síndrome Geral de Adaptação, que tem por objetivo viabilizar atitudes necessárias para a manutenção da vida diante de um mundo com infinitas ameaças.

E porque padecemos tanto por males provocados pelo estresse? Por que criamos nossos leões e nossas cobras, que, imaginários, nos perseguem a todo instante. Lidar com esses inimigos imaginários e trancafiá-los e o melhor caminho para vencer essas adversidades.

Sempre existe outro lado da moeda

Vivemos num época em que o acesso às coisas boas é muito maior. Trabalha-se menos. Sim, a jornada de trabalho em nossos tempos é muito menor que no século passado, antes da criação das leis trabalhistas, quando não era incomum trabalhar-se por mais de 16 horas por dia. Come-se mais. Nunca o acesso ao alimento foi tão grande e, apesar de focos de miséria e extrema pobreza, especialmente, na África, Ásia e América do Sul, hoje o maior problema de saúde é o excesso de alimentos. 

Com mais horas livres e mais comida por perto, associada à tecnologia, que nos trouxe mais conforto, assumimos uma vida sedentária, ficamos mais gordos, as veias ficam entupidas e começamos a morrer do coração. É um grande ciclo vicioso. Antes, morríamos pelo excesso de trabalho. Os trabalhadores se organizaram, exigiram menor carga de trabalho, o desenvolvimento tecnológico substituiu a mão de obra humana, ficamos ociosos e engordamos.


Preocupados com essa roda viva e essa contradição entre prazer e doença, conforto e culpa, ócio e obesidade, algumas pessoas vêm debatendo esse assunto. Principalmente, os profissionais de Saúde que estão convidando à população para praticarem mais exercícios e terem uma alimentação mais saudável e natural. Mas, apesar dos esforços, os resultados são pífios. As taxas de mortalidade por doenças crônico-degenerativas, cardio-vasculares e câncer ainda estão nas alturas.

Mas tem o outro lado da história. Gente que se preocupa em exagero e se deixa dominar por uma necessidade absoluta de só ingerirem alimentos naturais. Tal convicção consome boa parte do dia dessas pessoas, que, muitas vezes, tem o pensamento fixado nesta ideia, de tal modo que não conseguem fazer ou falar de outra coisa. Passam o dia em busca de alimentos naturais, estudam sobre alimentos saudáveis e se relacionam, somente, com pessoas que vivem este universo.


Especialistas afirmam que este não passa de outro distúrbio alimentar como a anorexia (foto) e a bulimia. Os anoréxicos e bulímicos mostram obsessão por peso e calorias e os ortoréxicos são obcecados pelos alimentos saudáveis (não é uma obsessão por ser magro ou perder peso). 

A ortorexia, portanto, é o outro lado da moeda. Faça o teste e avalie sua condição:


O maior número de respostas afirmativas fala a favor da ortorexia.


Você gostaria que, ocasionalmente, pudesse apenas comer e não se preocupar com a qualidade dos alimentos que ingere?

Você já desejou que pudesse gastar menos tempo com comida e mais tempo em outras atividades?

Faz parte das suas habilidades apenas comer uma refeição preparada por alguém que você ama – uma única refeição – sem pensar em tentar controlar o que é servido?

Você está constantemente procurando entender os motivos pelos quais os alimentos podem não ser saudáveis para você?

Trabalho, amor, diversão, criatividade estão em segundo plano, após a importância de uma dieta saudável, na sua vida?

Você se sente culpado ou com raiva quando abusa na dieta ou mesmo comete um pequeno deslize no seu planejamento alimentar?

Você se sente no controle quando come apenas alimentos considerados saudáveis?

Você já se sentiu melhor do que outras pessoas ao imaginar que você come adequadamente e não consegue entender como os outros podem comer determinados alimentos como fast food, enlatados, biscoitos gordurosos, entre outros?


Se você se encaixa nesta condição, que tal procurar um psicoterapeuta?

A violência como princípio da sobrevivência

Há alguns milhares de anos, o homo-sapiens, migrando da África para a Europa e ainda desenvolvendo boa parte da cultura que acumula até hoje, apenas fazendo pinça com o polegar e o indicador criava um dos grandes diferenciais em relação às outras espécies de animais e aprendia a manusear instrumentos e a fazer deles extensão de seu corpo.

Naqueles tempos rudes, o prazer dava lugar à luta pela sobrevivência. A sobrevida média era de 35 anos. Estavamos nos tempos da caverna, da descoberta do fogo, quando sobrevivia sempre o mais forte.

Nômades, nossos ancestrais vagavam em busca de alimento. Inicialmente, herbívoros, eram carnívoros eventuais, pois não detinham a cultura de domínio do animal selvagem e aproveitavam restos de animais abatidos por seus predadores naturais. E hoje nos sentimos superiores.

A espécie humana evoluiu, colecionou novos conhecimentos, migrou para o frio, onde se viu obrigada a adquirir meios para sobrevivência em meio inóspito. O frio, a escassez de alimentos e a ausência de proteção foram substratos essenciais para chegarmos a ser o que somos.

Nos alimentavamos para sobreviver, não existia prazer, e, aqueles que necessitavam menor quantidade de comida, os obesos, em momentos de escassez alimentar extrema, eram os que sobreviviam. Sim, os obesos detinham maior capacidade de sobrevivância durante as intempéries, pois, necessitavam de menor quantidade de calorias para a sua existência. Mas não eram gordos, porque comiam estritamente o necessário.

Aprendemos a domesticar os animais e a cultivar as plantas. Isso nos fixou ao solo onde buscamos proteção aguardando o crescimento do animal e dos vegetais. O excedente era desprezado, até que certo grupamento humano desprezava outros tipos de alimentos excedentes. Daí surgiu o escambo, que evoluiu para o comércio, que evoluiu para o marketing, que evoluiu tanto até que o obeso engordou.

Hoje vivemos o auge do conhecimento tecnológico, que permite conforto nunca visto durante toda a evolução de nossa espécie. Nunca antes na história deste planeta vivemos um período de tanta oferta de alimentos! Mas continuamos brigando, agora não mais pela sobrevivência, mas por motivos vis: por causa do trânsito, da conta do restaurante, por divergir de uma nota dada pela professora, entre tantos outros casos que assistimos diariamente nos meios de Comunicação. 

Industrializamos nosso alimento, comemos por prazer e o obeso que em outras épocas foi quem garantiu a preservação da espécie, hoje morre mais cedo, pois associou a vida sedentária e os prazeres da gula ao seu cardápio.

Quando vamos deixar de nos achar superiores?