Reconstruindo sonhos

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Reconstruindo sonhos



         Eu era muito jovem, 21 anos, universitário, pleno de sonhos e determinação para construir um mundo melhor de se viver. Vivíamos em plena ditadura militar. O ano era de 1980; a UNE - União Nacional dos Estudantes, acabara de realizar seu primeiro Congresso de reconstrução na legalidade em maio de 1979. Nossa sede, na Praia do Flamengo, no Rio de Janeiro, tinha sido sede do Clube Germânia, reduto dos simpatizantes do nazifascismo, até que os estudantes, em 1942, o tomaram para si, fazendo dele o centro das lutas estudantis. Em 1962, foi fundado ali o famoso CPC – Centro Popular de Cultura, pelo ator e dramaturgo Oduvaldo Viana Filho, o Cineasta Leon Hirszman e o sociólogo Carlos Estevam Martins. A proposta veiculada pelo CPC logo recebeu a adesão de vários outros artistas e intelectuais, entre os quais Ferreira Gullar, Francisco de Assis, Paulo Pontes, Armando Costa, Carlos Lyra, João das Neves, e tantos outros. Eram tempos em que ser reconhecida(o) não era ter o carro mais novo, a roupa de marca, o relógio caro. Ser charmosa(o) era saber escrever poesia, tocar violão, ser sensível e angustiado por tanto a ter que construir num país tão pobre e tão rico.

            Mas os sonhos acabam. Não, os sonhos, eles tentam destruir. Foi isso o que aconteceu naquela manhã do 1º de abril de 1964, os fascistas atearam fogo no prédio, destruíram tudo e quase a todos, se a estudantada não tivesse fugido pelos fundos do prédio.

            De 1964 a 1980, passava diariamente de ônibus pela praia, e lá estava o prédio enegrecido pela fuligem, estampando na nossa cara, os tempos de trevas.

            Por um ato discricionário do Governador do Estado da Guanabara, Sr Chagas Freitas, antevendo nossa intenção em voltar a ocupar a nossa sede, ordenou sua demolição. Mas a juventude é poderosa e transformadora. Foram dias de luta judicial, vigília na porta do prédio. Até que o Choque da Polícia resolveu entrar em ação e a porrada comeu solta. Foram 14 estudantes presos, e muitos machucados. Não esqueço de um deles, até hoje, grande amigo. Foram 11 pontos na cabeça! Saímos destruídos com nosso prédio no chão. Mas não destruíram nossos sonhos.

            Os tempos foram passando, me formei, casei, tive filhos; os projetos foram se renovando; até que hoje, aos 60 anos de idade, estou aqui de novo, cheio de sonhos e determinação para construir um mundo  de se viver.

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